Falta de acesso a diagnóstico de transtorno psicológico em jovens negros custa vidas
Um relato pessoal
Sempre me senti estranho. Algo parecia fora do lugar. Desde cedo uma melancolia, acompanhada de medos inexplicáveis, pensamentos ruins.
Na adolescência, idas a hospitais se tornaram frequentes. Anemia, problemas de coração, preguiça, todas as possibilidades pareciam plausíveis aos médicos e conhecidos para explicar os episódios de apatia ou ansiedade exagerada.
Morar em quebrada, onde informação sobre a saúde mental inexiste e nossa força precisa ser provada, trabalhando doente, cansado, à beira de enlouquecer enquanto você sabe que algo está te corroendo por dentro. As condições sociais fazem você ter de escolher entre sobreviver ao trabalho exploratório e à perseguição da polícia ou cuidar da saúde.
Aos 26 anos, ao fim de uma tarde, senti um mal súbito, fraqueza e palpitação. Os braços adormeceram e ficaram rígidos, dor no peito, formigamentos, tontura, sensação ruim. Entrei de cadeira de rodas no hospital com a certeza de que estava infartando. O enfermeiro indiferente, o ar parecia faltar. Foi a primeira grande crise de pânico que tive, resultado de anos de falta de um diagnóstico.
Os meses seguintes foram de crises diárias, idas aos hospitais e exames que não apontavam nada físico, até que um médico explicou que eu poderia estar com algum Transtorno de psicológico.
Se eu, morador de periferia, tivesse tido o diagnóstico ainda na infância ou adolescência, teria evitado anos de sofrimento. Finalmente, após pesquisar e aceitar o diagnóstico de um psiquiatra, percebi que muitas coisas que passei eram resultados de eu ter agido em função da ansiedade generalizada e pânico.
As taxas de suicídio entre jovens pretos é até 45% maior do que entre brancos da mesma idade. Nós, pessoas pretas somos compelidos a sermos fortes, nos negam bem-estar em todas as idades.
Política de prevenção ao suicídio é manter políticas públicas de acesso á saúde psicológica nas quebradas. Precisamos cuidar das mães pretas, cuidar dos jovens pretos. Agora!
Repost do meu texto lá no @africanizeoficial